O massacre de Waco, contado 30 anos depois pelo advogado que mediou o caso

18 abr 2023
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Dias depois de um confronto mortal entre uma seita religiosa e agentes federais em Waco, Texas, o advogado Dick DeGuerin recebeu uma chamada que há 30 anos pôs em suas mãos o "maior caso" de sua carreira até agora, e que gerou comoção nos Estados Unidos.

Era a mãe do líder da seita Ramo Davidiano, David Koresh, para pedir que defendesse seu filho.

Após as negociações, em 31 de março, esse advogado foi o primeiro a atravessar o cordão policial e a entrar no recinto onde os davidianos se reuniam, Monte Carmelo, para conversar com os entricheirados.

DeGuerin encontrou Koresh ferido no punho e no tronco e tratado com medicina holística por seus seguidores. Acreditava que conseguiria um acordo para sua rendição.

Três décadas depois, em seu escritório de Houston onde conserva os arquivos do caso, o advogado de 82 anos segue convencido de que o que terminou tragicamente em 19 de abril de 1993 - após um cerco de 51 dias - poderia ter acabado em paz e sem a morte de mais de 70 pessoas.

Seu relato desenrola um fio sensível nos Estados Unidos, um país polarizado, onde alguns veem Waco como um símbolo de abuso de autoridade por parte do governo.

Atualmente, um memorial, erguido onde ocorreram os fatos, atrai centenas de visitantes por mês. O local é administrado por novos davidianos.

DeGuerin conta que, quando pegou o caso, "não sabia da magnitude", mas tinha noção de que "o mundo estava olhando".

"Havia conduzido alguns casos importantes, mas nada como esse", acrescenta.

- Seu encontro com Koresh -

Os Ramos Davidianos foram fundados em 1959 como uma cisão da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Acreditavam no retorno iminente de Jesus, e Koresh surgiu como seu líder carismático na década de 1980.

Em 1993, a Agência de Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos (ATF) acusou o grupo de armazenar armas e obteve uma ordem de prisão contra Koresh, e outra, de busca para o complexo, onde houve denúncias de abuso infantil.

Em 28 de fevereiro, durante a operação, começou um tiroteio, no qual morreram quatro agentes federais e, ao menos, seis membros da seita.

O FBI isolou o lugar, inciando-se o "Cerco de Waco", que inspirou séries e documentários.

No final de março, quando DeGuerin entrou para ver Koresh, o FBI levou-o perto do local, na mala de um carro blindado. "Me disseram: 'Você gostaria de um colete à prova de balas?'. Eu disse: 'Não, não tenho medo dos davidianos. Mas não quero que os francoatiradores do FBI atirem em mim".

Ele confessa que não sabia o que esperar, mas que encontrou Koresh, de 33 anos, inteligente, eloquente, mas "muito enojado" pelo cerco do FBI e da ATF.

DeGuerin entendeu que sua missão era retirar Koresh do recinto e levá-lo à Justiça, "sem que ninguém mais morresse".

"Disse a ele que a lei é a lei e que tinha que obedecer, ainda que pudesse entrar em conflito com suas crenças religiosas. Ele entendeu", recorda.

Em paralelo, o advogado negociava um acordo com os Rangers do Texas, encarregados da segurança do complexo, para a rendição de Koresh.

- "Não precisamos mais de você" -

À medida que as negociações avançavam, DeGuerin voltou ao complexo com o advogado Jack Zimmerman, que representava outro membro da seita.

A paciência entre os agentes federais se esgotava.

"Estavam os negociadores que queriam que terminasse de forma pacífica. E depois o pessoal da equipe tática que só queria apressar, matar qualquer um e prendê-lo", considera DeGuerin. "O pessoal tático venceu".

Quando acreditava que tinha um acordo, viu pela televisão os agentes federais iniciando ações no local. Ele tentou voltar. "Não precisamos mais de você", disse-lhe por telefone um agente do FBI.

Nesse dia, 19 de abril, agentes do FBI em veículos blindados invadiram o complexo e lançaram gás lacrimogêneo. As causas do incêndio posterior ainda são discutidas, mas o complexo queimou totalmente, e mais de 70 pessoas morreram, incluindo Koreshe e cerca de 20 crianças.

As investigações absolveram as forças de segurança de irregularidades, mas Waco se tornou um grito de guerra para os americanos que acusavam seu governo de abuso de autoridade e estimulou o crescimento das milícias no país.

Em 1995, no segundo aniversário, Timothy McVeigh, que havia dirigido até Waco para presenciar o cerco, realizou um atentado com bomba na cidade de Oklahoma, que matou 168 pessoas.

Para DeGuerin, 30 anos depois, as lições de Waco são claras. Os agentes federais se convenceram de que Koresh "os estava enganando de novo" e que não se renderia.

"Não esperaram. Acredito que, se tivessem esperado, teria terminado em paz. Mas não foi assim", completou.


FONTE: Estado de Minas


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