Tensão em rodovia controlada pelo Clã do Golfo na Colômbia

22 mar 2023
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"AGC": três letras pichadas nos muros avisam que o Clã do Golfo controla o território. A quadrilha ligada ao tráfico de drogas mais poderosa da Colômbia semeia o terror em uma rodovia no noroeste do país e desafia o governo do presidente Gustavo Petro, durante um protesto de garimpeiros ilegais.

Também conhecidos como Autodefesas Gaitanistas da Colômbia (AGC), os narcotraficantes se impõem a tiros, proíbem o trânsito em uma via estratégica e deixam um rastro de pichações por onde passam.

Uma paisagem dominada por savanas arborizadas e prósperas fazendas de gado margeia a rodovia troncal do Ocidente, que liga a costa do Caribe colombiano a Medellín, segunda maior cidade do país. Habitualmente congestionada por caminhões de carga, é uma artéria importante, que garante o abastecimento a partir do norte da Colômbia.

Perto do município de Tarazá, uma dezena de supostos membros do Clã atearam fogo a dois ônibus e quatro caminhões no domingo. As carcaças carbonizadas foram deixadas na beira da estrada.

Desde então, apenas comboios de veículos protegidos por forças de segurança circulam enfileirados pela extensa faixa de asfalto: primeiramente, um enxame de motos; em seguida uma fila interminável de automóveis, entre eles uma ambulância e um carro fúnebre; por fim, ônibus e caminhões que emitem uma espessa fumaça preta.

Um carro blindado da polícia, vários jipes Humvee do Exército e motociclistas com pistolas na mão circulam na vanguarda e na retaguarda desta caravana barulhenta.

"Historicamente, o Baixo Cauca vive uma situação difícil, com a presença de grupos armados que exploram ilegalmente os cultivos de coca e o garimpo de ouro", explicou à AFP o general Eduardo Arias.

Além do Clã do Golfo, atuam na região facções da guerrilha do ELN e das dissidências das Farc que não aderiram ao acordo de paz de 2016.

- Corda no pescoço -

"A situação está sob controle", diz um soldado prestes a descer de um jipe para se juntar à operação. Quatro comboios deste tipo circularam pela rodovia nesta terça-feira, sob o olhar aparentemente sereno dos moradores das poucas cidadezinhas vizinhas.

Diana, gerente de um modesto restaurante de beira de estrada, testemunhou um atentado no domingo. No celular, ela mostra o vídeo de um ônibus em chamas, mas se nega categoricamente a dar entrevistas. "Falar do Clã é como colocar a corda no pescoço", diz outro morador.

Pintadas grosseiramente nas fachadas das casas, as siglas AGC são uma advertência. Esta região do Baixo Cauca, que liga os departamentos (estados) de Antioquia e Córdoba, foi um reduto dos paramilitares de extrema direita nas décadas de 1990 e 2000. A milícia anti-guerrilha depôs as armas em 2006, mas muitos de seus membros se distanciaram do processo de paz e fundaram o Clã.

Em 31 de dezembro, o presidente Gustavo Petro anunciou, no âmbito de seu plano ambicioso de "paz total", um cessar-fogo com o Clã do Golfo e outros grupos armados. Mas, no domingo, ordenou retomar as operações militares contra o cartel, alegando descumprimentos do pacto.

Segundo o governo, a quadrilha incentiva dissimuladamente os atos e o vandalismo dos garimpeiros ilegais de ouro, que protestam na região desde o começo de março contra a campanha oficial para destruir suas dragas.

Embora o movimento pareça estar em ponto morto, um de seus líderes em Tarazá, Gumercindo Castillo, 35, assegura que irão continuar protestando e nega qualquer vínculo com o Clã. "Pedimos ao governo federal que pare de nos estigmatizar. Nós não somos criminosos", disse à AFP.

- Triângulo das Bermudas -

"Há muitas informações que apontam que o Clã do Golfo está por trás do movimento dos garimpeiros", afirmou um jornalista local, que falou sob reserva, temendo represálias. "Começou contra o governo, mas acabou pegando a população como refém", lamentou.

"As pessoas não podiam circular, não conseguiam sair para comprar comida. Vinte dias sem trabalho. Foi como outra pandemia", lembrou o motorista Faber.

O Ministério da Defesa mobilizou 10 mil militares e policiais na troncal do Ocidente para retirar as árvores cortadas pelos manifestantes para bloquear a via. Mas "a estrada continua sob controle do Clã do Golfo", disse o jornalista.

Guerrilheiros do ELN também atuam na área. Castigada pela violência de mais de meio século de conflito interno, a região é conhecida como "Triângulo das Bermudas", devido aos desaparecimentos e sequestros de pessoas, que, às vezes, apareciam mortas em um rio próximo. "Durante anos, os grupos armados incendiaram veículos na estrada para mostrar sua presença", contou o jornalista.

A atividade nas cidades parece ter se normalizado, com lojas abertas, ao menos pela manhã, e alguns bares e boates a pleno vapor até o cair da tarde. "Mas avançamos a passos lentos", admitiu Andrés, dono de um restaurante localizado ao lado de um posto de gasolina. Há três dias, "'eles' nos deixam abrir", comentou, enigmático. Muitas ameaças e ordens de confinamento são compartilhadas pelo Clã do Golfo através do WhatsApp.

Após o fim da trégua com o governo, "a incerteza é total", admitiu um hoteleiro, também sob reserva. Na última segunda-feira, um soldado que estava de licença foi morto por homens que viajavam em uma moto, suspeitos de pertencerem ao Clã, segundo autoridades.

ASAHI GLASS


FONTE: Estado de Minas


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