As lutas fora e dentro do ringue do 1º grande atleta gay de ‘lucha libre’

09 out 2023
Fique por dentro de todas as notícias pelo nosso grupo do WhatsApp!

Cassandro tinha apelido de 'o exótico', enfrentou preconceitos e ganhou filme com Gael García Bernal, lançado em setembro. Ótima atuação faz ator ser cotado ao Oscar. 'Cassandro': assista ao trailer do filme sobre o ícone gay da 'lucha libre'

Saúl Armendáriz tem 53 anos de idade, 35 anos de carreira e dezenas de pinos de metal espalhados pelo corpo. São fruto dos ossos que quebrou durante eventos de “lucha libre”, a tradicional luta livre mexicana. Com o nome de Cassandro, ele foi o primeiro lutador gay e drag queen da modalidade a se tornar campeão mundial.

A história desse ícone queer voltou a ser mais comentada devido ao filme “Cassandro”, protagonizado por Gael García Bernal e disponível no Prime Video desde setembro passado. A atuação intensa e no tom certo faz o ator mexicano de 44 anos ser cotado para sua primeira indicação ao Oscar.

Como surgiram os exóticos?

Cassandro, o lutador mexicano de 'lucha libre' se prepara no ringue

Divulgação/Facebook do artista

Saúl era fã de “lucha libre” desde criança e acompanhou a evolução das diferentes categorias de lutadores. Desde a década de 40, eram comuns os lutadores chamados de “exóticos”, competidores que subiam no ringue maquiados, com perucas e roupas associadas às mulheres.

Esses personagens existiam basicamente para fins cômicos e para receberem insultos homofóbicos da plateia. Todos os lutadores exóticos, porém, se diziam heterossexuais na vida real. E quase nunca ganhavam: estavam no ringue para interpretarem os papéis de vilões, palhaços ou os dois ao mesmo tempo.

O lutador cresceu entre as cidades de El Paso, no estado americano Texas, e Ciudad Juárez, no México. O país era cheio de pequenas arenas onde heróis mascarados e vilões seguem um enredo combinado antes da luta. Assim como na luta livre americana, há margem para improvisos, mas os movimentos são coreografados e os resultados são acertados antes.

O começo discreto

Gael García Bernal (direita) interpreta Cassandro na cinebiografia do lutador mexicano de 'lucha libre', que aparece em pôster à esquerda

Divulgação

Saúl começou sua carreira em 1988, mas sem este nome e sem ser exótico. Com corpo esguio e movimentos rápidos, ele usava máscara preta e branca. Era vilão e usava o nome Mister Romano. Mais tarde, influenciado por um lutador exótico chamado Baby Sharon, mudou de estilo. Na primeira luta como exótico, ainda sem o codinome Cassandro, entrou no ringue vestindo uma blusa da mãe e a cauda do vestido da festa de 15 anos de sua irmã.

Aos poucos, Cassandro foi se soltando. Os looks e gestuais se tornaram extravagantes, com maquiagem carregada, topetes proeminentes e roupas cintilantes. O nome Cassandro passou a ser usado como uma homenagem à dona de um bordel em Tijuana, no México. Ela era conhecida por doar parte de seu dinheiro às crianças de rua e outras famílias de baixa renda.

No filme, porém, o lutador se inspira na protagonista da novela “Cassandra”, a preferida dele e de sua mãe, para se autobatizar. Como a cinebiografia deixa claro, a popularidade de Cassandro fez com que ele, aos poucos, fosse escalado para lutas melhores. Passou também a ser escolhido para ganhar combates. Tornou-se um herói da “lucha libre”.

Cassandro lutando

ROB BRAZIER

A honrosa derrota para um dos maiores "luchadores" de todos os tempos, Hijo del Santo, em 1991, também foi importante na trajetória. A relação com o “filho do santo” é bem retratada no filme: ele perde do homem da máscara de prata, mas tem a performance elogiada por ele e pelo público. Depois, faz uma participação emocionante no programa de TV do oponente. A luta rendeu ainda um dos maiores cachês que já havia recebido: 25 mil dólares.

Os bons resultados nas “lutas de apostas” também impulsionaram a carreira. Na modalidade, é comum os lutadores fazerem apostas: quem perder tem que raspar o cabelo; quem perder tem que tirar a máscara e revelar a identidade; quem perder nunca mais pode usar aquele nome; e por aí vai.

“Quando eu era criança pensava que não era ninguém”, comentou, em entrevista para a revista "The New Yorker", quando disse ter sofrido agressões sexuais na infância. “Pensava que era um rejeitado. Achei que não pertencia a este mundo. E quando me tornei um lutador exótico, senti algo do tipo ‘Uau, estou em casa’.”

Duas poses do lutador Cassandro, que ganhou filme estrelado por Gael García Bernal

Divulgação/Facebook do artista

Além das várias operações após contusões em lutas, teve que lidar com a reação de fãs. Uma vez, uma senhora o esfaqueou quando ele estava encarando um oponente, andando pela plateia. Em outra ocasião, uma idosa jogou uma xícara de uma ardente pimenta verde nas costas dele. Nesses e em outros casos, perdoou seus agressores: disse que é natural ficar exaltado quando o herói deles está apanhando.

Fora dos ringues, sofreu com problemas relacionados ao excesso de bebidas alcoólicas e cocaína. "Tudo aquilo fazia eu me sentia como a Mulher-Maravilha", resumiu. Após a morte da mãe, em 1997, passou por um período difícil e morou por um tempo no quintal de um amigo. Hoje, a data de sua sobriedade (4 de junho de 2003) está tatuada em suas costas.

Cassandro posa em dois momentos em fotos de divulgação de suas lutas

Divulgação/Facebook do artista

Antes um bad boy, Cassandro tornou-se um embaixador da luta livre e um ícone gay. Hoje, ele dá palestras sobre diversidade em lugares como a Embaixada dos EUA na Cidade do México e universidades locais.

O lutador segue na ativa em turnês lutando e falando com paradas em países como Inglaterra, França e Japão. Devido aos contatos na embaixada americana e entre celebridades mexicanas, diz que sempre tenta ajudar lutadores mexicanos a conseguir vistos americanos. Até agora, contabiliza ter dado auxílio para mais de cem "luchadores".

Cassandro, o lutador mexicano de 'lucha libre' se prepara no ringue

Divulgação/Facebook do artista

Cassandro, o lutador mexicano de 'lucha libre', posa camuflado em um arbusto

Divulgação/Facebook do artista

Cassandro, o lutador mexicano de 'lucha libre', faz um alongamento

Divulgação/Facebook do artista


FONTE: G1 Globo


VEJA TAMBÉM
FIQUE CONECTADO