Olivia Hime realça belezas atemporais da obra de Francis Hime em disco de atmosfera clássica

04 out 2023
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Exceto pela capa inexpressiva, o álbum 'Se eu te eternizar' soa sedutor pela sintonia entre melodias, letras, arranjos e o canto maturado da artista de 80 anos. Francis Hime é o arranjador de 'Se eu te eternizar', álbum em que Olivia Hime canta 12 músicas do compositor, incluindo a inédita 'Valsa sedutora'

Nana Moraes / Divulgação

Capa do álbum 'Se eu te eternizar', de Olivia Hime

Divulgação

Resenha de álbum

Título: Se eu te eternizar

Artista: Olivia Hime

Edição: Selo Sesc

Cotação: ★ ★ ★ ★ 1/2

♪ Exceto pela capa inacreditavelmente inexpressiva, nada surpreende de fato no 16º álbum de Olivia Hime, Se eu te eternizar, lançado em 29 de setembro pelo Selo Sesc. Dedicado ao cancioneiro de Francis Hime, parceiro da cantora e compositora na vida e na música, o disco está ambientado na mesma atmosfera clássica dos álbuns anteriores da artista carioca, como o antecessor Espelho de Maria – Canções de Dori Caymmi, Edu Lobo e Francis Hime (2018).

Aos 80 anos, Olivia Hime se beneficia da maturação da voz, que soa como bom vinho ao degustar a obra de Francis neste disco tão confortável quanto sedutor por evidenciar belezas eternas de títulos menos conhecidos do cancioneiro do compositor carioca, arranjador do álbum.

Parceria de Francis Hime com Zélia Duncan, a inédita Valsa sedutora já vale o disco pelo arrebatamento da melodia de Francis, da precisão dos versos de Zélia e pelo caráter sublime das cordas da St. Petesburg Studio Orchestra, arranjadas pelo próprio Francis.

Na sequência, um samba requintado – Breu e graal (2014), apresentado por Francis há nove anos no álbum Navega ilumina (2014) com letra de Thiago Amud, discípulo do compositor – se revela épico, no toque da cuíca de Marcos Thadeu, após ser introduzido por farta citação instrumental de Embarcação (1982), admirável samba da parceria de Francis com Chico Buarque.

Nessas águas aliciantes, também emerge Mar enfim, música composta por Francis nos anos 1960, somente agora letrada com propriedade por Olivia Hime e apresentada em gravação em que os versos surgem nas ondas da harpa de Cristina Braga após o ouvinte escutar toda a melodia sem letra.

Antes, Pássara (1980) – mais uma obra-prima da parceria de Francis com Chico Buarque – alça voo de rota imprevisível porque o intrincado arranjos de Francis busca outros caminhos harmônicos na gravação feita por Olivia em dueto com Zélia Duncan. Ao fim, os cantos das artistas parecem se desencontrar, mas sabem perfeitamente por onde caminham.

Líricas imagens aquáticas banham Menino de mar (2019), parceria de Francis com Olivia lançada há quatro anos por Francis no álbum Hoje (2019) e ora reavivada pela cantora com Dori Caymmi, cuja voz parece vir dos profundos mares do patriarca, um certo Dorival Caymmi (1914 – 2008), em gravação que se situa entre a ciranda e a marcha-rancho.

Valsa de contornos cariocas, composta por Francis com Olivia e lançada pelo cantor no já mencionado álbum Navega ilumina, Amorosa (2014) ganha pela primeira vez a voz da parceira, mas com arranjo do violonista Paulo Aragão e o toque clássico do Quarteto Maogani.

Olivia Hime canta músicas menos conhecidas do cancioneiro de Francis Hime, como 'Anunciação' e 'Ribeirinho', no álbum 'Se eu te eternizar'

Nana Moraes / Divulgação

Com letra escrita por Paulo César Pinheiro por volta de 1973, Círculo fechado se abre para o público após 50 anos. Inédita, a música versa sobre as tramas do tempo e da vida com densidade sublinhada pelas cordas da recorrente St. Petesburg Studio Orchestra – cordas que também emolduram com classe a canção Meu melhor amigo (1977), composição que há 46 anos abriu a parceria de Francis com Olivia Hime.

Não por acaso, o título original do álbum Se eu te eternizar era Canções do meu melhor amigo até que Olivia decidiu rebatizar o disco com o verso inicial da Valsa sedutora.

Com o toque do bandolim de Pedro Amorim e das sete cordas do violão de Maurício Carrilho, Ribeirinho (1982) desenha paisagem rural na cadência de choro-canção. Lançada por Francis no álbum Pau Brasil (1982) e desde então nunca mais gravada, Ribeirinho é música melancólica com letra de Cacaso (1944 – 1987), um dos maiores poetas da canção brasileira.

E por falar em poeta, Paulo César Pinheiro reaparece no álbum Se eu te eternizar como letrista do samba Anunciação, parceria com Francis apresentada pelo grupo MPB4 em 1969 na quarta edição do Festival Internacional da Canção (FIC).

Nunca mais gravada, a música se alterna entre a cadência do samba e o compasso de valsa na gravação feita por Olivia com Sérgio Santos. O arranjo majestoso de Francis valoriza a música, menos imponente no conjunto grandioso das obras dos compositores.

Na sequência, a cantora desfolha A invenção da rosa (2006), samba mais calmo composto por Francis com letra do poeta Geraldo Carneiro. No arremate do álbum, Eterno retorno (Francis Hime e Geraldo Carneiro, 2009) tem a harpa de Cristina Braga a sublinhar o tom onírico e alucinado das imagens que vem à mente do eu-lírico da canção.

Gravado por Lucas Ariel no Estúdio Biscoito Fino, entre 24 de outubro e 16 de novembro de 2022, sob direção musical de Pauloi Aragão, o álbum Se eu te eternizar é valorizado pela seleção corajosa de repertório em que Olivia Hime ilumina belezas já esquecidas do cancioneiro de Francis Hime.

Por tudo que se ouve neste disco de alto nível artístico, trabalho que terá daqui a 50 anos o mesmo valor que tem hoje, o álbum Se eu te eternizar merecia capa à altura das canções, dos arranjos e da voz maturada da cantora.


FONTE: G1 Globo


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